O regime de bens mais adotado neste país é o regime da comunhão parcial de bens pelos casais. Não deve ser ignorado que muitos casais vivem na informalidade convivendo em união estável.
Pois bem. Se você está se separando do seu cônjuge (pelo divórcio ou pela dissolução da sociedade de fato) e pior, além da separação você foi demitido da empresa em que trabalha. Pergunta que eu devo fazer:
- As minhas verbas rescisórias deverão ser partilhadas com meu cônjuge ou com meu companheiro ou companheira?
A discussão aqui tratada interessa tanto para aqueles que são casados na comunhão parcial de bens quanto para aqueles que vivem em união estável.
No contexto social brasileiro, e muito em função da crise econômica do país, sabe-se que boa parcela da população não chega a constituir grandes fortunas ao longo da vida, sendo que o principal patrimônio acumulado é oriundo do esforço individual e fruto do TRABALHO de cada um.
Assim, muito se questiona acerca da divisão do patrimônio do casal que vivia em regime de comunhão parcial de bens.
- Os direitos trabalhistas, em especial a multa dos 40% do FGTS, as férias indenizadas, as horas extras não recebidas na fase do contrato de trabalho, devem ser partilhados em caso de divórcio ou dissolução de sociedade de fato?
Inicialmente, é oportuno fazer alguns esclarecimentos acerca do casamento pelo regime de comunhão parcial. Neste regime de casamento, comunicam-se os bens adquiridos na constância do casamento ou da união estável, com as seguintes exceções (Art. 1.659, do Código Civil/02):
I – os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar;
II – os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação dos bens particulares;
III – as obrigações anteriores ao casamento;
IV – as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal;
V – os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão;
VI – os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge;
VII – as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes.
Desta forma, no regime de comunhão parcial, comunicam-se os bens adquiridos no período em que o casal conviveu juntos. Em outras palavras, com exceção das sete hipóteses acima, todo o patrimônio adquirido ao longo do casamento ou da união estável presumem-se adquiridos por esforço comum do casal, portanto, deverá ser partilhado, meio a meio.
Como se vê, os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge (salário e demais direitos trabalhistas), pela regra expressa no Código Civil não entram na partilha de bens, ou seja, não se comunicam e não devem ser partilhados no divórcio do casal ou na dissolução da sociedade de fato.
Entretanto, o Judiciário e boa parte da Doutrina vem mitigando ou flexibilizando a redação literal deste dispositivo do Código Civil, sustentando que os salários e demais ganhos decorrentes do trabalho constituem-se em bens adquiridos onerosamente durante o casamento e pela lógica, devem se comunicar.
É simples o entendimento adotado pelos Tribunais brasileiros, se o casal convivia e se sustentava com os salários percebidos, é notório que servia para constituir o patrimônio comum. Mas, se esse salário não tenha sido pago a algum dos cônjuges na época da constância do casamento, vindo a ser recebido em ação trabalhista posteriormente, como por exemplo, ação trabalhista pleiteando horas extras não pagas, prêmios e etc., esta quantia deverá ser partilhada porque é fruto da época em que o casal convivia em união estável ou em regime da comunhão parcial de bens.
Explicando melhor, no caso de uma ação trabalhista e que venha a obter êxito, as verbas trabalhistas devidas por força de decisão judicial, ainda que pendentes de pagamento devem ser partilhadas quando demonstrado que se relacionam ao período de convivência dos cônjuges (ou companheiros).
Caso o FGTS recolhido no período em que perdurou o casamento ou a união estável não seja liberado antes do fim do relacionamento, o valor da meação deverá ser integrado no cálculo da partilha e, caso não seja possível o abatimento, deverá ser reservado junto ao órgão gestor, a Caixa Econômica Federal.
A mestre em Direito de família, Maria Berenice Dias[1], sustenta que se os ganhos do trabalho não se comunicam e nem se dividem, pensões, rendimentos e outros de igual natureza, praticamente tudo será incomunicável, pois a maioria das pessoas vive de seu trabalho.
Diz a estudiosa, o fruto da atividade laborativa dos cônjuges não pode ser considerado incomunicável, e isso em qualquer dos regimes de bens, sob pena de aniquilar-se o regime patrimonial, tanto no casamento como na união estável, porquanto nesta também vigora o regime da comunhão parcial (CC/02, art. 1.725). De regra, é do esforço pessoal de cada um dos cônjuges que advêm os créditos, as sobras e as economias para a aquisição dos bens conjugais.
Mas é importante salientar que os direitos trabalhistas, inclusive o FGTS, que foram adquiridos ANTES ou DEPOIS do casamento não se comunicam, ou seja, não devem ser partilhados com o cônjuge na separação. Os direitos trabalhistas, inclusive o FGTS, quando adquiridos DURANTE o casamento, se comunicam e devem ser partilhados.
Diante do divórcio de cônjuges que viviam sob o regime da comunhão parcial de bens, ou sob a proteção da união estável, não deve ser reconhecido o direito à meação dos valores que foram depositados em conta vinculada ao FGTS em datas anteriores à constância do casamento e que tenham sido utilizados para aquisição de imóvel pelo casal durante a vigência da relação conjugal. Ao contrário, só deve ser reconhecido o direito à meação dos valores do FGTS auferidos DURANTE a constância do casamento, ainda que o saque daqueles valores não seja realizado imediatamente à separação do casal.
Caso o FGTS tenha sido utilizado na aquisição de imóvel do casal, deve-se apurar os valores que foram depositados na conta vinculada antes e depois do casamento ou do início da união estável. Por exemplo: caso o FGTS utilizado tenha sido integralmente recebido antes do casamento, não se cogitará a divisão do patrimônio e o imóvel pertencerá exclusivamente ao cônjuge que utilizou o fundo.
[1]DIAS, Maria Berenice. Regime de bens e algumas absurdas incomunicabilidades. Disponível em: www.mariaberenice.com.br
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